Entre 2005 e 2011, 475 brasileiros, na maioria mulheres, foram
vítimas de tráfico internacional de pessoas, geralmente voltado para
exploração sexual. No mesmo período, a Polícia Federal abriu 157
inquéritos para investigar esse tipo de crime, que resultaram em 381
indiciamentos e apenas 158 prisões. Os dados, divulgados nesta
terça-feira pelo governo federal no lançamento do II Plano Nacional de
Enfrentamento do Tráfico de Pessoas, indicam que menos da metade dos
crimes investigados levam à punição dos autores.
A situação é ainda mais grave porque, apesar das campanhas de
esclarecimento, é alta a subnotificação de casos, segundo informou o
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ao lançar o plano em conjunto
com as ministras da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora
Menicucci; e da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário.
"Trata-se de um crime subterrâneo, difícil de ser combatido porque as
vítimas não denunciam, seja por medo ou vergonha", observou o ministro.
Na ocasião também foi apresentado o primeiro relatório com dados
consolidados sobre esse crime no País.
O plano tem cinco eixos, destinados a melhorar a performance do
Brasil no enfrentamento do tráfico de pessoas, começando pelo
aperfeiçoamento do marco regulatório. O governo encampou um projeto que
aumenta a punição e amplia o alcance da lei, de modo a incluir na
tipificação, por exemplo, o trabalho escravo e o tráfico de crianças
para transplante de órgãos ou retirada de tecidos. Outro projeto prevê a
perda dos bens de membros de organizações criminosas que exploram essa
atividade. Cardozo disse que vai apelar ao Congresso para que inclua os
dois projetos em regime de urgência.
O segundo eixo promoverá a integração e o fortalecimento das
políticas públicas e redes de atendimento às vítimas. Uma meta é criar
dez novos núcleos ou postos de enfrentamento ao crime até 2014 nos
locais de grande circulação - hoje são 13 postos e 16 núcleos. Serão
investidos nessa ampliação R$ 5,9 milhões, incluindo aí a capacitação de
agentes nas áreas relacionadas ao tema. Os postos serão localizados em
cidades da fronteira seca do Brasil com os países vizinhos. Os outros
dois eixos se destinam à produção de informações técnicas e a campanhas
de educação e mobilização da sociedade no combate ao crime.
O governo vai também criar um cadastro das vítimas de tráfico de
pessoas no exterior. O objetivo, segundo a ministra Eleonora, é que 100%
delas tenham sua situação monitorada para que lhes sejam assegurados
direitos legais, como atendimento jurídico e reparação civil por danos
materiais e morais. Entre as 125 metas setoriais, uma prevê a abertura
de diálogo com os países vizinhos para o combate articulado às
organizações criminosas especializadas em tráfico de pessoas. Uma
comissão tripartite acompanhará a execução das medidas do plano.
Capacitação
O treinamento de profissionais da educação e da segurança inclui
técnicas de capacitação para que possam identificar as diversas
situações usadas por criminosos para camuflar o tráfico de pessoas e
atos de violência contra mulheres. "Os agentes do estado precisam estar
capacitados para identificação, combate às organizações criminosas e
apoio às vítimas", disse Cardozo. "Mas é preciso que as pessoas percam o
medo e denunciem. Para haver investigação tem que ter notícia do
crime".
Maria do Rosário qualificou o tráfico de pessoas como "uma grave
violação de direitos humanos". Ela disse que ultimamente o problema
ganhou mais visibilidade em razão da novela Salve Jorge, da TV Globo,
que mostra mulheres brasileiras exploradas sexualmente na Turquia por
quadrilha internacional. Mas a ministra Eleonora acha que a realidade é
pior do que a ficção. "O que a novela mostra é pouco. A situação é muito
mais grave, alarmante e preocupante", disse.
Ela apelou para que as pessoas denunciem situações pelo Disque 180.
Em um ano disponibilizado para o exterior, o serviço permitiu duas
grandes operações que resgataram 40 mulheres de várias nacionalidades na
Espanha. As denúncias partiram de Portugal e Espanha, em abril e
outubro de 2012. "A denúncia é fundamental para que o crime venha à luz e
os criminosos sejam punidos", esclareceu Eleonora.
Registro
O relatório aponta dificuldade em reunir provas nesse tipo de crime, o
que dificulta a punição. O registro dos casos também é dificultado pela
própria legislação, tida como inadequada, pois prevê somente o tráfico
para fins de exploração sexual, deixando à margem outras modalidades,
como tráfico para fins de remoção de tecidos, ou partes do corpo e o
trabalho escravo.
Conforme o estudo, de um total de 475 vítimas brasileiras
identificadas pelo Ministério das Relações Exteriores, entre 2005 e
2011, 337 sofreram exploração sexual e 135 foram submetidos a trabalho
escravo. Os países onde mais foram localizadas vítimas foram Suriname
(porta de entrada para a Holanda), com 133 casos; Suíça (127) e Espanha
(104). Para a Holanda diretamente foram traficadas 71 mulheres.
Dados da PF revelam que são as mulheres, na maioria, as aliciadoras,
recrutadoras ou traficantes, que somam 55% dos indiciamentos. Já os
presos são na maioria homens (65%). Eles respondem também pela maior
parte dos casos de agressão a vítimas do tráfico de pessoas.
http://br.noticias.yahoo.com/475-brasileiros-foram-v%C3%ADtimas-tr%C3%A1fico-internacional-214200470.html