“Sendo sincero, os cálculos no meu caso foram majorados. Teve um
recálculo dentro da faculdade que poderia diminuir o valor, mas eu não
quis ficar entrando em minúcias, não. Queria uma solução que colocasse
uma pedra no problema, ainda que fosse mais onerosa."
Othon Lopes, coordenador do curso de direito e condenado a devolver R$ 154 mil à UnB
Quatro professores da Faculdade de Direito vão ter que devolver juntos
quase R$ 1,2 milhão à Universidade de Brasília pelo período em que,
submetidos ao regime de dedicação exclusiva, acumulavam outras
atividades remuneradas. Eles assinaram um termo de ajustamento de
conduta junto ao Ministério Público Federal no dia 19 de abril, que
investigava o caso a pedido de alunos há dois anos. A validade do acordo
depende agora da homologação na 5ª Câmara de Coordenação e Revisão.
A denúncia contra Ana de Oliveira Frazão, Frederico Henrique Viegas de
Lima, Othon de Azevedo Lopes – que é coordenador da graduação – e Suzana
Borges Viegas de Lima ainda dizia que os professores não estariam
realizando atividades de pesquisa e extensão, exigidas dos docentes.
Também como parte do acordo, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão
da UnB alterou o contrato dos professores, que passaram do regime de 40
horas semanais para 20 horas semanais.
O G1 procurou o reitor, o procurador-geral e os quatro professores por
meio da assessoria da universidade, mas apenas um deles, que é o
coordenador do curso, Othon Lopes, quis comentar o assunto. “Resolvi
celebrar o TAC porque não tenho interesse, não acho que seja positivo
deixar essa situação pendente”, afirmou.
Trecho do TAC, que mostra quanto cada professor deverá devolver à universidade (Foto: Reprodução)
“Sendo sincero, os cálculos no meu caso foram majorados", disse. "Teve
um recálculo dentro da faculdade que poderia diminuir o valor, mas eu
não quis ficar entrando em minúcias, não. Queria uma solução que
colocasse uma pedra no problema, ainda que fosse mais onerosa.”
Para a restituição dos valores, 30% serão descontados mensalmente do
contracheque dos professores, inclusive após a aposentadoria deles, até
que a dívida seja quitada. O acordo prevê ainda que se eles morrerem
antes do pagamento do débito, a quantia poderá ser cobrada do espólio
deles. E, se deixarem a universidade, deverão pagar os valores restantes
em até seis meses, sob pena de multa de R$ 20 mil, além da cobrança
imediata da dívida.
“Eles precisam ver que o não cumprimento da obrigação deles tem uma consequência nefasta na nossa formação."
Marcos Vinicius Queiroz, coordenador-geral do centro acadêmico de direito
Condenado a pagar R$ 154,4 mil pelo período em que advogou, entre 2006 e
2012, Lopes afirmou também que atualmente trabalha apenas na
universidade. Ele disse que vai continuar na coordenação do curso e que,
além das disciplinas Direito Econômico e Exame de Proficiência, vai
desenvolver atividades de pesquisa e extensão.
“Só estou indo para 20 horas para não ficar submetido a
constrangimentos desse tipo, para não abrir margem para um eventual novo
questionamento”, disse o professor.
Responsável por acompanhar o caso no MPF, o procurador da República
Bruno Calabrich afirmou que a decisão beneficia a universidade. “Foi
particularmente interessante para a UnB, porque, se ajuizássemos ação
contra esses professores, a tendência seria depois de alguns anos no
máximo conseguir o que conseguimos agora. Ou de no máximo conseguir
condenar os professores a um pagamento simbólico de R$ 3 mil."
Faixa pregada na faculdade por alunos do centro acadêmico de direito (Foto: Raquel Morais/G1)
Calabrich disse ainda que, apesar de caber a abertura de um processo
por improbidade administrativa e eventual demissão, o TAC tem “efeito
pedagógico” melhor que qualquer outra punição. Para o procurador, o
acordo deixa claro que o acúmulo de atividades é irregular e resolveu a
situação mais rápido do que se fossem adotadas as outras alternativas.
“Infelizmente é uma prática que eu ensejo que se repete no Brasil
inteiro. Existe um pensamento extremamente equivocado de que somente
[exercer outras] atividades públicas impediriam dedicação exclusiva, o
que é um raciocínio equivocado. Advocacia também é uma atividade e o
exercício da advocacia é incompatível com a dedicação exclusiva. É um
problema que deve ser solucionado, e não só na UnB. É urgente que seja
solucionado, nós temos que acabar com essa história”, afirmou o
procurador.
Repercussão
O diretor da Faculdade de Direito, George Galindo, disse acreditar que a
devolução do dinheiro seja a solução mais adequada ao caso. Ele afirmou
que os professores continuarão a exercer as mesmas atividades que
tinham antes, porque a diferença entre os regimes de 20 e 40 horas
semanais não é quantidade de disciplinas, mas sim a execução de projetos
de pesquisa e extensão.
“O que a gente vai tentar fazer é ver a possibilidade de abrir novos
concursos para receber professores que tenham perfil para essas outras
áreas. Em pesquisa eu acho que a gente vem bem, nossa pós-graduação tem
nota 5 na Capes, enquanto a maior nota entre cursos de direito é 6. A
gente precisa é melhorar as questões da extensão”, afirmou. “Agora, o
direito precisa também desses professores que tenham vivência prática,
que façam 20 horas semanais.”
Para o coordenador-geral do centro acadêmico, Marcos Vinicius Queiroz, a
decisão é favorável dentro das limitações judiciais. “Diante da
realidade da universidade pública brasileira, a gente acredita que é uma
vitória. Não é o ideal, caberia um processo por improbidade
administrativa, mas é uma solução rápida e que pesa no bolso. E eles
precisam ver que o não cumprimento da obrigação deles tem uma
consequência nefasta na nossa formação.”
Faixa de alunos de direito da UnB reclama da falta
de atividades de extensão (Foto: Raquel Morais/G1)
O representante do 5º semestre do curso, Guilherme Chamum, se disse
satisfeito com a assinatura do TAC. "A gente quer lembrar aos
professores que eles são funcionários públicos e têm obrigações a
cumprir."
Formulário
Recentemente os alunos de direito também criaram um formulário para
controlar e exigir a presença dos professores nas aulas. Quando o atraso
é superior a 30 minutos, o representante da turma assina um documento
na secretaria informando a falta do profissional.
Galindo afirmou ver com bons olhos a atuação dos estudantes. "Acho que é
um processo de aprendizado para todo mundo. Não existe nenhuma
instituição completamente perfeita. Vejo as iniciativas deles como muito
naturais e bem-vindas, porque trazem coisas para melhorar a situação
acadêmica."
Membro do centro acadêmico, Lucas Carneiro, afirmou que a ideia surgiu
depois que um dos docentes faltou a 80% das atividades no último
semestre. “Desde que começamos a aplicar o formulário, há mais ou menos
dois meses, houve três casos de destaque”, contou o estudante. “Mas
aqui, o excepcional é não ocorrer atraso. Dentro desse período de
meia-hora de tolerância, por assim dizer, sempre tem.”
Centro acadêmico estimula que alunos de direito preencham formulário que controla faltas de professores (Foto: Raquel Morais/G1)
De acordo com as normas da universidade, os alunos podem ter no máximo
25% de faltas ao longo do semestre. Não há determinações em relação à
presença dos professores.
http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2013/05/quatro-professores-fazem-acordo-para-devolver-r-12-milhao-unb.html