Vira
e mexe, nessa campanha eleitoral, aparece nos jornais que o “mercado” é
contra a Dilma. Lendo as notícias, demorei a entender que o chamado
“mercado” – como se este fosse uma entidade abstrata que nunca dá as
caras – é na verdade o mercado financeiro.
Nos textos de jornais, porém, o “mercado”, quando parece expressar
suas vontades políticas, raramente é identificado. Suas “fontes” de
informação, frequentemente, são “consultores” ou “analistas” ou
“investidores”, quase sempre ocultos, o que no jargão jornalístico
significa que estas pessoas falam em “off” ou off the records.
Este ocultamento leva, na verdade, a uma inflação indevida no uso da
palavra “mercado” pela imprensa. O chamado “mercado” pode virar, assim,
tudo e qualquer coisa. Pode-se resumir a um ou dois investidores que,
num determinado momento, precisam se valer da circulação de informações
para especular, por exemplo, com papeis na bolsa de valores. O “mercado”
teme isso ou teme aquilo nas manchetes, em certas circunstâncias, pode
não ser nada mais do que boatos ao vento lançados por bocas miúdas para
favorecer ganhos pontuais ou de ocasião.
Seja como for, esta hipertrofia no uso da palavra “mercado” não
significa dizer que ele não exista. Pelo contrário. Aprendi com um
jornalista experiente que conhece a área financeira que o que interessa
fundamentalmente ao “mercado” é a relação entre as contas do Governo e o
que este pode pagar de juros da dívida pública. O Brasil tem uma dívida
pública que vem de décadas e supera 2 trilhões de reais. Os governos
nunca pagam essa dívida, mas sim os juros dela, a “rolagem”; para tanto o
governo emite ou negocia títulos.
Foi com a manutenção dessa engrenagem que Lula se comprometeu em
2002 quando lançou a Carta ao Povo Brasileiro, garantindo ao “mercado”
que caso eleito honraria os compromissos. Isto significa: se comprometer
com o “superávit primário” (a economia que o governo faz para pagar os
juros da dívida para o “mercado”), manter a estabilidade econômica e
tudo o mais. Isto Lula fez com maestria durante seus dois governos – ele
foi o “cara”, disse Obama (para saber como Lula e o PT ganharam a
confiança de Washington e Wall Street, com a ajuda de FHC e dos tucanos,
recomendo vivamente a leitura do livro “18 dias”, do professor da FGV
Matias Spektor).
Aparentemente Dilma não quebrou nem pretende quebrar este
compromisso de fundo, vital, com o “mercado”, ou seja, com aqueles que
lucram com o rolar da dívida pública (tema crucial jamais debatido em
campanhas – o que o governo paga anualmente de juros no Brasil equivale a
dez vezes o orçamento do Bolsa Família).
Mas, mesmo assim, é inegável que o “mercado” não quer Dilma. Demorei
a entender o porque, mas acho que cheguei perto de uma conclusão (e já
está na hora de colocar um ponto final no post). O “mercado” não gosta
da maneira como este governo faz a gestão das contas públicas, o que os
jornais e a oposição chamam de “operações heterodoxas” ou “contabilidade
criativa”. O Governo é acusado de embaralhar seus dados econômicos,
transferindo dinheiro de fundos e de caixas para outros fundos e outros
caixas para poder “fechar” as contas públicas, que sofre com a falta de
crescimento econômico (para não falar na intervenção em preços como o da
gasolina, mantidos artificialmente baixos para segurar a inflação).
Este modo de operar gera uma dúvida de futuro sobre as reais capacidades
do Governo de continuar a pagar os juros da dívida, pois os dados
básicos não estariam “claros” (ou “transparentes”) o suficiente. Uma
questão, afinal, de o Governo demonstrar que administra a dívida de
forma que esta não se torne impagável – que é quando um país quebra. Não
há luta do bem contra o mal: é uma questão de capacidade de pagamento a
curto, médio e longo prazos.
É uma pena que este seja um tema tão espinhoso e difícil de
entender, pois ele é fundamental. Ao colocar na TV propagandas mostrando
bancos como agentes do mal, o PT, embora possa obter dividendos
eleitorais imediatos, mais confunde do que esclarece, pois o partido já
não é um antagonista real dos banqueiros há muito tempo (desde 2002, com
certeza). No final fica até um situação curiosa. Enquanto o “mercado”
odeia Dilma, esta é identificada por eleitores (39% pelo Ibope) como a
candidata que “representa o sistema financeiro” (mais do que Aécio e
Marina). O eleitor entende do seu modo o país em que vive.
https://br.noticias.yahoo.com/blogs/rogerio-jordao/por-que-o-mercado-e-anti-dilma-110630579.html