Tashfeen Malik vestia equipamento tático e uma máscara preta ao lado do seu marido na semana passada, quando eles atacaram o Inland Regional Center em San Bernardino, Califórnia, onde ele trabalhava. Ambos morreram após um demorado tiroteio com a polícia algumas horas mais tarde e estão no centro da investigação sobre o pior ataque terrorista em solo americano: o atentado de 11 de setembro de 2001.
Malik, cidadã paquistanesa de 29 anos, mãe de um bebê, jurou lealdade
ao ISIS no Facebook antes do ataque mortal. Mas suas ações não refletem
necessariamente os ideais e as regras que o ISIS estabelece no califado
para as mulheres.
O ISIS disse publicamente que Malik e seu marido, Syed Rizwan Farook,
era “partidários do califado”, não soldados, forma como eles geralmente
descrevem seus seguidores.
A propaganda para mulheres ocidentais mostra frequentemente mulheres usando burka
e munidas de uma AK-47. A mensagem do ISIS sublinha o “empoderamento”
das mulheres, de acordo com Mia Bloom, especialista em terrorismo e
professora da Georgia State University. Eles têm alcançado grande sucesso em recrutar mulheres Americanas, observa Karen Greenberg, diretora do Center of National Security na Fordham University’s School of Law.
O grupo alega que o feminismo falhou com as mulheres e diz que apenas
no califado elas poderão encontrar sua verdadeira natureza.
Na prática, o ISIS afirma que prefere as mulheres cuidando dos
maridos e dos filhos, não se envolvendo em qualquer tipo de combate. No
verão passado, uma filial do ISIS definiu as regras de participação para
mulheres em combates. O chamado tratado de Zura, traduzido pelo perito
Charlie Winter, incentiva as mulheres a apoiar os homens com suas
habilidades domésticas, como “enfermagem, costura…cozinhar, lavar roupas
e outras coisas”.
O documento detalha algumas circunstâncias nas quais é considerado
aceitável que mulheres participem ativamente como combatentes. Mulheres
podem fazer ataques suicidas em sua própria casa ou em lugares públicos
caso esteja sendo atacada por “infiéis”. Nessas situações, o tratado diz
que elas podem se explodir “sem permissão”.
As mulheres também têm permissão para agirem como franco atiradoras.
Em circunstâncias especiais, ainda podem participar de operações
especiais, como fez Malik. Mas isso se restringe à permissão de um
líder, desde que seja para o “bem público”.
“Uma mulher não deve se juntar ao exército ou à brigada, pois isso
leva à corrupção”, diz o Tratado. Esta relutância em permitir que as
mulheres lutem, difere o ISIS de outros grupos terroristas que têm
criado acampamentos especiais para treinar mulheres em combate.
“Eles projetam uma imagem para atrair mulheres para o califado, mas
estas mulheres aprendem rapidamente que nunca chegarão a tocar em uma
arma”, diz Bloom. “Elas podem ter um marido que impede a saída delas de
casa”.
Iraqi Sajida al-Rishawi, mostrando seu cinturão de suicídio
enquanto fala sobre sua tentativa fracassada de detonar o cinto dentro
de um dos três hotéis da Amman dirigidos pela al-Qaeda. (Foto: Jordanian
TV via AP)
Alguns especialistas acreditam que as regras do ISIS para as mulheres apoiam as ações de Malik. Rita Katz dirige o SITE Intelligence Group,
uma empresa privada de inteligência que controla as redes terroristas
globais. Segundo ela, o grupo não chama pessoas como o casal de San
Bernardino de “soldados”, pois parece que eles não estavam em contato
direto com o ISIS antes do ataque.
“O ISIS já usou mulheres para operações de suicídio no passado”, diz
Katz. “Para eles, isso não é a mesma coisa que participar de uma
situação real de combate”.
Katz aponta o exemplo de Sajida al-Rshawi, que foi executada na
Jordânia no início deste ano por seu papel em um ataque que matou 60
pessoas no país, embora sua bomba não tenha detonado. O ISIS queimou um
piloto jordaniano até a morte enquanto exigia a libertação dela.
Um outdoor exibe um versículo do Alcorão que incita as mulheres a
usarem um hijab nos territórios controlados pelo ISIS na Síria. (Foto:
Reuters)
As severas regras criadas para as mulheres do califado também são
diferentes das que o ISIS encoraja as mulheres a seguirem em seus países
de origem, disse Katz. Os vídeos do ISIS que incentivam ataques
solitários no ocidente se dirigem a muçulmanos em geral em vez de
“irmãos”, uma distinção semântica que inclui claramente as mulheres.
“Eles gostariam que outras mulheres do ocidente fossem inspiradas por estes atos”, doz Katz sobre Malik.
As autoridades ainda investigam a ideologia de Malik e Farook, apesar
de acreditarem que o casal era radical por bastante tempo e que Malik
nutria lealdade pelo ISIS. O Los Angeles Times relatou que Malik estava
matriculada em um curso de 18 meses em uma madrasa (instituição educacional) chamada de Al-Huda Institute, em Multan, no Paquistão. Ela abandonou o curso antes de terminá-lo para se casar com Farook, que ela conheceu online.
Al-Huda é uma escola religiosa incrivelmente popular entre as
mulheres do Paquistão e é muito criticada por pregar uma visão estreita e
conservadora do Islã, que proíbe que as mulheres ouçam música, falem
com homens que não sejam seus parentes e saiam descobertas em público.
Mas apesar de sua retórica frequentemente antiocidental e
fundamentalista, a Al-Huda nunca havia sido ligada a qualquer tipo de
violência.
Sua visão das mulheres como companheiras que devem encorajar seus
homens a se tornarem mais religiosos está em consonância com a ideologia
de gênero do ISIS. O carismático fundador da escola, Farhat Hashmi,
ensina que as mulheres devem usar o véu para manter o interesse do
marido e suas famílias intactas, de acordo com o livro Transforming Faith,
de Sadaf Ahmad. Ele também ensina esposas a se disponibilizarem
sexualmente para seus maridos a todo momento, afim de evitar
infidelidade, outro valor compartilhado pelo ISIS.
Um porta voz da Al-Huda disse ao New York Times que o grupo não tem nada a ver com as ações de Malik.
Uma cópia do Alcorão e um envelope de plástico na casa dos
suspeitos Syed Rizwan Farook e Tashfeen Malik em Redlands, Califórnia. (Foto: Mario Anzuoni/Reuters)
https://br.noticias.yahoo.com/o-isis-acha-que-o-lugar-de-mulheres-jihadistas-%C3%A9-111536872.html