O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Marco Aurélio Mello, defendeu a proibição das “doações” de empresas para as campanhas políticas. “Não temos altruísmo no Brasil. E o troco que é cobrado sai muito caro para a sociedade brasileira”, disse o ministro num
programa de entrevistas criado pelo TSE. A primeira edição vai ao ar às 13h30 desta quarta-feira, na TV Justiça.
Durante meia hora, Marco Aurélio respondeu a perguntas de quatro jornalistas convidados. O blog participou da conversa. A certa altura, referindo-se à ação que questiona no STF a constitucionalidade das contribuições eleitorais de pessoas jurídicas, ele afirmou que a proibição representaria “um avanço”. Acha que, a partir de uma interpretação do texto constitucional, o Supremo deve sinalizar a necessidade de uma reforma política —“uma reforma profunda, não apenas de fachada”, achou conveniente enfatizar.
O julgamento da ação mencionada por Marco Aurélio começou em 12 de dezembro passado. Foi interrompido por um pedido de vista feito pelo ministro Teori Zavascki. Antes da suspensão, quatro dos 11 ministros do Supremo sustentaram que as doações feitas aos candidatos por empresas são inconstitucionais. São eles: Luiz Fux (relator), Joaquim Barbosa, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli. Com suas declarações, Marco Aurélio, que também integra o plenário do STF, deixou claro que irá adensar esse grupo. Restará, então, apenas um voto para atingir a maioria.
A perspectiva de fechamento das torneiras empresariais gerou protestos no Congresso. Puxaram a chiadeira os presidentes da Câmara, Henrique Eduardo Alves, e o do Senado, Renan Calheiros. Ambos sustentaram que a eventual proibição de doações de empresas representaria uma intromissão do STF num tema que é de competência exclusiva do Legislativo. Marco Aurélio deu de ombros. Afirmou que o Judiciário não irá “substituir-se ao legislador.” Nas suas palavras, o Supremo irá apenas “interpretar a lei das leis, que é a Constituição.”
O ministro declarou-se a favor do voto facultativo e do financiamento público exclusivo de campanha. Novidades que, aí sim, dependeriam de aprovação do Congresso. Empenhado em bombardear as doações empresariais, Marco Aurélio fez uma pergunta irônica. Que ele próprio respondeu: “Será que essa doação se faz por uma ideologia, pela adesão a este ou aquele partido? A resposta é desenganadamente negativa.”
Encerrada a entrevista, Marco Aurélio ainda conversou com os jornalistas por cerca de dez minutos antes de deixar o plenário do TSE. Nesse pedaço da conversa, ele previu que, após proibir as doações de empresas, o STF deve apreciar uma proposta de “modulação”, para definir se a proibição deve vigorar já nas eleições de 2014 ou apenas nos pleitos futuros. Se depender do ministro, o veto às doações empresariais entra em vigor já.
“Por que não observar já nessas eleições?”, indagou Marco Aurélio. “Aí vem o argumento de que esse ato beneficia quem está tentando a reeleição em detrimento da oposição. Paciência. Podia ser o contrário.” Vão esmiuçadas abaixo outras declarações feitas por Marco Aurélio ao longo da entrevista:
- Limitações ao trabalho do Ministério Público Eleitoral: Marco Aurélio declarou-se convencido de que o TSE irá atender ao pedido da Procuradoria-Geral Eleitoral e revogar a resolução que condiciona a abertura de investigações de crimes eleitorais à autorização da Justiça.
Elaborada por Dias Tofoli, vice-presidente do TSE, a fatídica resolução foi aprovada no final do ano passado por seis votos a um. Só Marco Aurélio votou contra. A despeito do placar “acachapante”, o ministro disse confiar na “evolução do tribunal”. Por quê? “A Constituição assegura essa prerrogativa ao Ministério Público. Uma prerrogativa que está explicitada também no Código de Processo Penal.”
Foi sempre assim em eleições anteriores, realçou Marco Aurélio. E não houve nenhuma modificação da legislação que indicasse essa limitação ao Ministério Público. “De qualquer forma, a quem interessa a limitação?”, indagou o presidente do TSE, abstendo-se de responder. “A pergunta fica no ar.”
E se a maioria do TSE decidir ignorar o pedido da Procuradoria? Bem, nessa hipótese, a encrenca subirá para o STF, anteviu Marco Aurélio. “A última trincheira da cidadania é o Supremo”, disse.
- Vem pra urna: Marco Aurélio celebrou o ronco das ruas como um avanço, um momento em que “o brasileiro abandona a apatia, que é algo nefasto.” Condenou, porém, o vandalismo. E reiterou a necessidade de “conscientizar o eleitor sobre a importância do voto.” Nas palavras do presidente do TSE, o eleitor “não é vítima dos maus políticos”. Está mais para “autor” dos malfeitores, porque os escolhe.
“O local ideal do protesto é a urna, é a eleição”, exortou Marco Aurélio. “A data exata para ter-se um protesto efetivo é 5 de outubro, na qual nós estaremos escolhendo os nossos representantes.” A publicidade institucional do TSE realçará esse tópico. “Não se protesta queimando lixeiras, depredando prédios públicos e particulares. O local de protesto por excelência é a urna eleitrônica.”
- Ficha Limpa: Na opinião de Marco Aurélio, a Justiça Eleitoral já dispõe de instrumentos legais para “afastar aqueles candidatos que não têm uma vida passada irreprochável, imaculada.” Espera que, aparelhado com a Lei da Ficha Limpa, o Judiciário não adote o que chamou de “minimalismo judicial”. Comparou: “Nós não vivemos na Suíça, na Suécia, nós vivemos no Brasil, um país continental, com muitos brasis diferentes.” Reconheceu o óbvio: a Justiça, inclusive a Eleitoral, é demasiado lenta. No TSE, “estamos ainda julgando controvérsias alusivas as eleiçoes de 2008. Isso não se coaduna com a celeridade e economia processuais.” Como resolver? Mediante a aprovação de leis que limitem o número de recursos judiciais e dotem os TREs e o próprio TSE de um quadro permanente de juízes.
- Mensalão e mensalinho: Marco Aurélio afirmou que as eleições de 2014 devem ser “conturbadas”. Por quê? Deu a entender que o processo do mensalão do PT, em fase final de julgamento dos recursos, e a ação penal do “mensalinho mineiro” do PSDB, em fase de alegações finais, devem virar munição eleitoral. Não pareceu preocupado. “Nós preciamos tornar concreta a legislação e aplicar. Só assim nós afastaremos inclusive do cenário esse sentimento de impunidade”.
- Partidos de fachada: Marco Aurélio participou de quase todas as sessões do TSE que resultaram na aprovação de abertura de novos partidos. Votou contra a criação do PSD de Gilberto Kassab, do Solidariedade de Paulinho da Força e da Rede de Marina Silva. Só não votou contra o Pros dos irmãos cid e Ciro Gomes porque não estava na sessão.
O presidente do TSE não se conforma com as três dezenas de partidos políticos em funcionamento no Brasil. “Às vezes a coisa tem que chegar a um extremo para ter-se uma correção de rumos. Quem sabe estamos caminhando para esse extremo.”
Não acha que já atingimos o extremo? “É um exagero realmente. Temos partidos no cenário que são partidos de fachada, criados para posteriormente negociar tempo de tevê, para ter a aparticipação no fundo partidário, que recebe verbas públicas. A esse contexto é que a meu ver nao atende sequer a razoabilidade.