O ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato de Souza Duque,
condenado na Operação Lava Jato há mais de 50 anos de prisão como braço
do PT no esquema de propinas na Petrobrás, retomou as negociações para
um acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal.
Detido há um ano e cinco meses, em Curitiba (PR), o conteúdo de suas
revelações envolve o partido, a presidente afastada Dilma Rousseff e o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sistemática de cartel e
corrupção na estatal – com rombo reconhecido até aqui de R$ 6,2 milhões.
Lula é um dos pontos centrais das negociações com a força-tarefa da
Lava Jato. Além de confirmar que o ex-presidente sabia do esquema, o
ex-diretor da estatal teria provas documentais para apresentar. As
tratativas são feitas com membros da Procuradoria Geral da República
(PGR), por citar políticos com foro privilegiado, e da Procuradoria, em
Curitiba.
A colaboração do ex-diretor – se for aceita pela Procuradoria e
homologada pela Justiça – pode ser a primeira a ligar diretamente Dilma
ao esquema sistematizado de corrupção como “regra do jogo” na Petrobrás,
a partir de 2004 e que vigorou até 2014. Nesta semana, a presidente
afastada virou alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) por
tentativa de obstrução às investigações.
No esquema alvo da Lava Jato, diretores indicados e sustentados nos
cargos por partidos, em especial PT, PMDB e PP, tinham orientação
expressa de seus “padrinhos políticos” para “ajudarem” as legendas com
obtenção de recursos de empresas contratadas pela estatal. Obras de
refinarias de mais de R$ 20 bilhões, como a Abreu e Lima, em Pernambuco,
o pacote de construção de plataformas de exploração de petróleo para o
pré-sal, negócio de US$ 21 bilhões, tiveram desvios de 1% a 3% já
comprovados em juízo.
Dilma e Lula na mira da Lava Jato. Fotos: Dida Sampaio e Werther Santana/Estadão
O braço direito de Duque na estatal, Pedro Barusco, confessou em
delação, fechada em 2015, que o PT teria recebido em dez anos mais de R$
100 milhões em propinas, segundo suas estimativas, via Diretoria de
Serviços. Espécie de contador informal do dinheiro da corrupção que
entrava para a área controlada pelo partido, ele entregou os registros
dos valores recebidos via ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto,
identificado com o codinome Moch – referência à mochila preta usualmente
carregada por ele.
Avanço. Preso desde março de 2015, em Curitiba (PR),
e condenado a mais de 50 anos de detenção em três processos julgados
pelo juiz da Lava Jato, Sérgio Moro, Duque mudou seu endereço prisional
no último mês. Deixou o Complexo Médico-Penal, em Pinhais, onde está a
maioria dos detidos do caso, e voltou para a carceragem da
Superintendência da Polícia Federal para facilitar as entrevistas com
investigadores.
É a terceira tentativa de delação de Duque, que foi diretor da
Petrobrás entre 2003 e 2012, indicado na cota controlada pelo
ex-ministro José Dirceu (Casa Civil, governo Lula). As negociações estão
em fase de discussão de anexos, em que a defesa elabora um esboço dos
crimes que ele vai confessar e os novos fatos ilegais que vai revelar,
em troca de uma redução de pena.
Figura emblemática da Lava Jato, o ex-diretor ligado ao PT foi preso
em duas operações. A primeira, em novembro de 2014, foi levado para a
cadeia junto com o primeiros empreiteiros acusados de cartel – entre
eles o presidente da OAS, José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro, que
negocia delação, e o dono da UTC, Ricardo Pessoa, já delator. Liberado
um mês depois, Duque voltou a ser preso em março de 2015, flagrado
tentando transferir fortuna de 20 milhões de euros da Suíça para Mônaco.
O nome da operação reproduziu a frase dita por ele, quando pela
primeira vez recebeu em sua porta agentes da Polícia Federal: “Que País é
Esse?”.
Dilma e Moro. Apesar das duas outras tentativas
frustradas, o contexto agora é outro. As tratativas avançam às vésperas
do julgamento final da cassação do mandato presidencial de Dilma, no
Senado, e da conclusão dos primeiros inquéritos que têm Lula como alvo
da força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba.
O ex-presidente é alvo de pelo menos três inquéritos, em Curitiba. Um
deles, que apura a compra, a propriedade e as reformas no Sítio Santa
Bárbara, em Atibaia (SP), está em fase final. O imóvel seria propriedade
oculta da família do petista, reformada pelas empreiteiras OAS e
Odebrecht, como contrapartida por negócios na estatal, sustentam os
investigadores.
A defesa do ex-presidente nega e diz que não há relação das obras e da propriedade com os desvios na estatal.
No caso de Dilma, se o Senado confirmar sua cassação e a Lava Jato
fechar acordo com Duque – comprovando aquilo que o ex-diretor diz -, ela
corre o risco de enfrentar investigações em Curitiba, base do juiz
Sérgio Moro.
Até aqui, a presidente afastada é alvo do inquérito aberto pelo STF
nesta semana para apurar envolvimento dela, do ex-presidente Lula, do
ex-senador Delcídio Amaral – também delator – e dos ex-ministros Aloizio
Mercadante (Educação Casa Civil) e José Eduardo Cardozo (Justiça) em
três episódios de suposta tentativa de obstrução à Lava Jato.
São apuradas as responsabilidades da petista na compra do silêncio do
ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, a nomeação do ministro
Alexandre Navarro Dantas para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a
nomeação de Lula como ministro da Casa Civil – todos episódios
considerados pelos investigadores tentativas de obstrução à Justiça.
COM A PALAVRA, O INSTITUTO LULA
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva informou, por meio de nota
divulgada pela assessoria de imprensa do Instituto Lula, que “não
cometeu nenhum ato ilegal nem antes nem durante, nem depois do exercício
de dois mandatos como Presidente da República, eleito pelo voto popular
para dois mandatos”. “Não comentaremos supostas negociações de delações
para a obtenção de benefícios judiciais”, informa a nota.
O ex-presidente atacou os investigadores da força-tarefa e disse, na
nota, que “graves violações aos direitos fundamentais de Lula foram
comunicados ao Comitê de Direitos Humanos da ONU”. “Os operadores da
Lava Jato persistem na prática ilegal e inconstitucional de antecipar
juízos sobre investigações em curso e de fomentar propaganda opressiva
contra o ex-presidente Lula. Mesmo depois de uma devassa, os
investigadores não conseguiram produzir uma prova sequer para denunciar
Lula.”
Leia a íntegra da nota do Insituto Lula:
“Os operadores da Lava Jato persistem na prática ilegal e
inconstitucional de antecipar juízos sobre investigações em curso e de
fomentar propaganda opressiva contra o ex-presidente Lula. Mesmo depois
de uma devassa, os investigadores não conseguiram produzir uma prova
sequer para denunciar Lula. Produzem manchetes que não primam pelo
equilíbrio jornalístico. As graves violações aos direitos fundamentais
de Lula foram comunicados ao Comitê de Direitos Humanos da ONU em
28/07/2016.
O ex-presidente Lula não cometeu nenhum ato ilegal nem antes nem
durante, nem depois do exercício de dois mandatos como Presidente da
República, eleito pelo voto popular para dois mandatos.
O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), a partir de uma
reclamação formulada pelos advogados de Lula, abriu sindicância para
apurar a conduta de membro do MPF que sistematicamente viola
determinações daquele órgão de controle ao formular acusações contra o
ex-Presidente na imprensa antes da finalização das investigações. Há
outra denúncia ainda pendente de apreciação pelo CNMP pela mesma prática
nefasta contra outros quatro membros do MPF.
http://www.ejornais.com.br/jornal_da_tarde.html