O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa,
afirmou nesta segunda-feira (8) a representantes de entidades de
magistrados que eles agiram de forma "sorrateira" ao apoiar a aprovação,
pelo Congresso Nacional, da
criação de quatro novos tribunais regionais federais. As associações negaram e disseram que os tribunais são necessários para o país.
Barbosa se reuniu com os presidentes da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do
Trabalho
(Anamatra), da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e da
Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Jornalistas puderam
acompanhar parte da audiência. O presidente do STF é contra a criação
dos TRFs sob o argumento de que o custo é elevado e que caberia ao
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidir sobre novos tribunais.
"Continuo a dizer que foi aprovado de uma maneira açodada. Havia outras
soluções e há outras soluções. Mas foi tudo feito à base de conversas
de pé de ouvido, sem manifestação oficial de órgãos importantes do Poder
Judiciário, do CNJ", disse Barbosa às associações.
O
presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, durante
reunião com associações de juízes, nesta segunda (8)
Nesse instante, o vice-presidente da Ajufe, Ivanir César Ireno Junior,
que participava da audiência, interveio: "Me perdoe, Vossa Excelência,
mas o Conselho Nacional de Justiça, em 2010, eu até tenho o número do
processo, se manifestou sobre a PEC."
Barbosa negou: "Não, não se manifestou. O CNJ ficou de criar uma
comissão e essa comissão nunca foi criada. Essa é que é a verdade. Nunca
foi criada."
Foi tudo feito à base de conversas de pé de ouvido, sem manifestação
oficial de órgãos importantes do Poder Judiciário, do CNJ"
Joaquim Barbosa,
sobre a criação de mais 4 tribunais federais
O presidente do STF, então, disse que a atuação das entidades foi "à base de cochichos".
"A nota técnica teria que se basear no trabalho de uma comissão, de um
grupo de experts, que nunca houve, que nunca foi criado. Ou seja, mais
uma vez se toma uma decisão de peso no país sem ouvir o CNJ. Ou seja, à
base de cochichos. Os senadores e deputados foram induzidos a erro.
Porque ninguém colocou nada no papel", afirmou em tom duro.
O vice-presidente da Ajufe destacou que a entidade acompanhou por 13
anos o processo. Barbosa rebateu dizendo que a entidade não tem poder
constitucional sobre criação de tribunais, apenas atua como órgão de
representação.
"Não confunda a legitimidade que o senhor tem enquanto representante
sindical com a legitimidade dos órgãos do Estado. Eu estou dizendo é que
órgãos importantes do Estado não se pronunciaram sobre o projeto que
vai custar à nação, por baixo, R$ 8 bilhões", disse Barbosa a Ireno
Junior, da Ajufe.
O presidente da Ajufe, Nino Toldo, acrescentou que cada tribunal
custaria no máximo R$ 100 milhões ao ano. E, Barbosa, disparou: "Pelo
que eu vejo, vocês participaram de forma sorrateira na aprovação. [...]
São responsáveis, na surdina, pela aprovação."
Sorrateira, não, ministro. Sorrateira, não. [De forma] Democrática e transparente"
Ivanir César Ireno Junior (Ajufe),
ao rebater Barbosa sobre criação de tribunais
E Ivanir César Ireno Junior, da Ajufe, rebateu de forma dura:
"Sorrateira, não, ministro. Sorrateira, não. [De forma] Democrática e
transparente."
Joaquim Barbosa travou uma tensa discussão, então, com o
vice-presidente da associação. "O senhor abaixe a voz que o senhor está
na presidência do Supremo Tribunal Federal." O vice reagiu afirmando que
estava só argumentando.
E Barbosa completou: "Então só me dirija a palavra quando eu lhe pedir.
Concluo: a minha posição, tomada assim de última hora, porque estava
perplexo. Como é que quase duplica o número de tribunais federais no
Brasil dessa maneira. Os senhores não representam o Conselho Nacional de
Justiça. Os senhores não representam o STJ, representam seus interesses
corporativos legítimos. Mais isso não supre a vontade dos órgãos
estatais. Compreendam isso. Os senhores não representam a nação. Não
representam os órgãos estatais. Os senhores são representantes de
classe. Só isso."
Empregos
Em outro momento do debate, Joaquim Barbosa disse que as entidades
defendiam os novos tribunais porque criariam empregos. "É muito bom para
a advocacia a criação de quatro novos tribunais com mais milhares de
empregos de juízes. [...] Mas isso não é o interesse da nação", disse.
Quando Nino Toldo afirmou que queriam apresentar um estudo sobre o
tema, Barbosa ironizou: "Esses tribunais vão ser criados em resorts, em
alguma grande praia."
Eu não tenho obrigação de saber o seu nome"
Joaquim Barbosa ao presidente da Ajufe
Audiência com as entidades
O encontro começou tenso porque o presidente do STF não queria que
todos os presentes participassem, como diretores e vice-presidentes das
entidades. No entanto, acabou liberando a entrada. Ao término do
encontro, pediu que "da próxima vez", compareçam apenas aqueles que
pediram a audiência.
Às entidades, Barbosa solicitou que, quando tivessem alguma crítica,
que fossem diretamente a ele. "Quando os senhores tiverem algo a
acrescentar, colaborar, aprimorar, antes de ir à imprensa, dirijam
documentação à minha assessoria."
Há pouco tempo, Joaquim Barbosa, que veio do Ministério Público, se
envolveu em disputa com entidades de classe porque disse que juízes
faziam "conluios" com advogados por interesses próprios. Além disso,
também foi criticado pelos juízes por dizer que tinham mentalidade
"pró-impunidade". Em razão desses atos, as entidades divulgaram notas
oficiais para rebater Joaquim Barbosa.
O clima tenso da reunião mostra que esse diálogo não será fácil."
Nino Toldo, presidente da Ajufe, após reunião com Barbosa
Nino Toldo lembrou que a audiência foi pedida em dezembro do ano
passado. Nesta segunda, Barbosa recebeu as associações de magistrados
pela primeira vez.
Ao argumentar que tinha agenda muito cheia, dirigiu-se à Nino Toldo
dizendo que recebeu "esse senhor" havia quatro meses. O presidente da
Ajufe respondeu: "Meu nome é Nino Toldo". Barbosa respondeu em tom
ríspido: “Eu não tenho obrigação de saber o seu nome”.
No fim do encontro, Nino Toldo disse que a audiência mostrou que o
diálogo com o STF "não será fácil". “A Ajufe, junto com as demais
associações de classe da magistratura, procurou, nessa reunião,
estabelecer diálogo com o presidente do Supremo Tribunal Federal e do
Conselho Nacional de Justiça. Contudo, o clima tenso da reunião mostra
que esse diálogo não será fácil."
G1