Ativistas dos direitos humanos na Argentina alegam que o novo Papa teria tido ligações com o regime militar, mas não existem provas concretas. Vaticano refuta denúncias e diz que elas têm motivação política.
Nem todos os argentinos estão animados com a escolha do ex-arcebispo de Buenos Aires Jorge Mario Bergoglio para ser o novo Papa. Alguns chegam a considerar a eleição um erro. "Pensamos que se tratava de uma brincadeira", afirmou a ativista Graciela Lois, da organização Familiares de Desaparecidos e Detidos por Razões Políticas. "Para nós essa não foi uma boa escolha."
Assim como outro ativistas dos direitos humanos na Argentina, Lois suspeita de uma ligação muito próxima de Bergoglio, então chefe da ordem jesuíta do país, com a ditadura militar nos anos 1970.
Após a eleição do papa Francisco, a presidente Cristina Kirchner congratulou o ex-arcebispo de Buenos Aires sem muito entusiasmo e até com algum atraso. A frieza da reação não causou surpresa: é fato conhecido que Kirchner e Bergoglio nunca tiveram um relacionamento amigável, o que não deverá mudar no futuro.
Sérias alegações
Ativistas acusam Bergoglio de ser cúmplice em sequestros e torturas de oponentes do regime militar – ou, no mínimo, de omissão. Carlos Pisoni, da associação Hijos, que tenta localizar pessoas desaparecidas durante a ditadura, diz que existem provas suficientes de que o novo Papa teve um papel ativo durante o regime militar. "Acredita-se que ele repassava informações aos militares e que se recusou a contribuir para o esclarecimento de alguns casos."
O caso mais conhecido refere-se ao sequestro de dois padres jesuítas em 1976. Eles foram levados ao centro de tortura ESMA, onde sofreram abusos. Liberados após seis meses, acusaram Bergoglio de tê-los denunciado. "Ele não cumpriu com a sua responsabilidade, como chefe dos jesuítas, de proteger os dois padres", observa Lois.
Por essa razão, um advogado de direitos humanos chegou a denunciar na Justiça o então arcebispo de Buenos Aires em 2005, alguns dias antes de ele perder a eleição do conclave papal para o cardeal alemão Joseph Ratzinger.
Um outro caso é o desaparecimento de uma jovem durante a ditadura. O irmão dela teria pedido ajuda a Bergoglio, mas o esforço teria sido em vão.
Falta de provas
Ambos os casos foram examinados por um tribunal, com a presença de Bergoglio no papel de testemunha. No caso dos jesuítas, o então arcebispo negou as acusações e afirmou ter intercedido pessoalmente junto ao então presidente Jorge Rafael Videla pela libertação dos padres. Também na sua autobiografia, o novo pontífice rebate as acusações. Seus opositores não conseguiram apresentar provas concretas sobre as alegações, e Bergoglio jamais foi acusado pela Justiça.
Alguns suspeitam que, por trás dessas acusações, haveria uma campanha política contra o teólogo conservador. Os defensores de Bergoglio alegam que ele chegou até a esconder opositores do regime, ajudando-os a deixar o país clandestinamente.
Além disso, o novo Papa tem um proeminente defensor, o escultor Adolfo Pérez Esquivel, que em 1980 recebeu o Prêmio Nobel da Paz em razão de seu comprometimento com os direitos humanos. Esquivel garante que o papa Francisco não era alinhado com a ditadura. Ele afirma que alguns bispos eram cúmplices do regime, mas Bergoglio certamente não era um deles.
O Vaticano também refuta as acusações, afirmando que elas têm motivação política e carecem de fundamento. "Nunca houve uma acusação concreta e credível contra ele", afirmou o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi.