Márcio Nakashima chorou várias vezes e apontou Mizael como possessivo.
Técnicos mostraram indícios para tentar colocar ex-PM na cena do crime.
O depoimento do irmão de Mércia Nakashima, de um biólogo e de um
engenheiro marcaram o primeiro dia do júri popular do policial militar
aposentado Mizael Bispo de Souza, realizado no Fórum de Guarulhos, na
Grande São Paulo. A sessão foi encerrada pelo juiz às 20h30 desta
segunda-feira (11) e será retomada nesta terça-feira (12), às 9h.
Em um depoimento de mais de quatro horas em que chorou várias vezes,
Márcio Nakashima
alinhou os argumentos que sustentam sua desconfiança em relação a
Mizael, ex-namorado de Mércia, disse não se conformar "com a cara de
pau" dos advogados do réu e apontou o ex-cunhado como possessivo.
Também foram ao plenário nesta segunda o
biólogo
Carlos Eduardo de Mattos Bicudo que apontou indícios de que Mizael
esteve na represa onde o corpo de Mércia foi encontrado. E o engenheiro
Eduardo Amato Tolezani, que apresentou a metodologia usada na análise
das ligações feitas pelo celular de Mizael e do posicionamento do carro
do réu na noite do crime.
Mizael, à direita, fala com um advogado no 1º dia do júri.
Um dia Mizael chegou [no escritório novo] muito nervoso e chegou a ameaçar ela de morte"
Márcio Massami Nakashima, irmão de Mércia
Mércia Nakashima
foi vista pela última vez com vida em 23 de maio de 2010, após sair da
casa dos pais, em Guarulhos (SP). Depois de vários dias de investigação e
buscas, bombeiros encontraram, no dia 10 de junho de 2010, o carro da
vítima – um Honda Fit prata – no fundo de uma represa em Nazaré
Paulista, vizinha a Guarulhos.
Na manhã seguinte, o corpo de Mércia foi localizado. O laudo do
Instituto Médico Legal (IML) indicou morte por afogamento em 23 de maio,
depois da vítima ter sido baleada de raspão no rosto e nas mãos e
sofrer um desmaio.
À polícia, um pescador afirmou que, em 23 de maio, quando se preparava
para pescar na represa, viu um carro ser abandonado na água. Ele contou
que ouviu gritos antes do veículo submergir e que no local estava um
homem alto, cuja face não conseguiu enxergar.
Com o inquérito concluído, a Justiça pediu a prisão de
Mizael,
ex-namorado da vítima, e do vigilante Evandro Bezerra Silva, que teria
encontrado com o suspeito na noite do crime e, posteriormente, tentado
vender informações sobre o caso para a família da vítima. Dias depois,
no entanto, a decisão foi revogada e ambos puderam responder o processo
em liberdade.
Balanço do 1º dia
O promotor Rodrigo Merli disse que o primeiro dia do julgamento foi
positivo. Ele ressaltou o depoimento de Márcio Nakashima, irmão de
Mércia. "Márcio veio com a questão do relacionamento conturbado (entre a
vítima e o acusado), da motivação, de inexistirem outros suspeitos para
o crime."
Ele lembrou o bate-boca que teve com os advogados durante o depoimento
da terceira testemunha. "Não sei se é má-fé, ignorância ou estratégia do
doutor Ivon de não aceitar a resposta da testemunha (...) Estou achando
que é estratégia me tirar do sério."
Questionado se irá fazer algo para evitar se irritar, brincou: "Vou
tomar um calmante à noite para ver se amanhã a gente volta mais calmo.
Com esse advogado é difícil."
A defesa não quis dar entrevistas.
Irmão
Márcio Nakashima pontuou a deterioração no relacionamento entre Mércia e
Mizael. "No início era um relacionamento normal. Depois ele se
transformou, virou um sujeito possessivo", afirmou. Segundo Márcio,
Mizael foi o único namorado que Mércia teve na vida. Ele contou que os
dois já haviam se desentendido muito quando trabalharam no mesmo
escritório de advocacia, em razão de honorários que Mizael devia para
ela. O irmão disse que a vítima abriu então um novo escritório e relatou
ameaça que teria sofrido do réu. "Um dia Mizael chegou [no escritório
novo] muito nervoso e chegou a ameaçar ela de morte", afirmou.
O irmão de Mércia também apontou as razões de sua desconfiança em
relação a Mizael. Ele afirmou que pediu ajuda de Mizael para encontrar
Mércia porque acreditava que a ela tinha sido sequestrada. Ele disse que
o acusado se recusou a ajudar. "Ele não quis me atender, mas até ai eu
achei normal, porque nessa época eu já não falava com ele".
Ele disse ainda ter visto Mizael arrancar cartazes espalhados pelas
ruas pela família, pedindo informações sobre Mércia. Também afirmou que
soube que Mizael tentava o arquivamento do boletim de ocorrência de
desaparecimento, registrado pela família no 6º Distrito Policial de
Guarulhos (SP), o que motivou a família de Mércia a buscar ajuda no
Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) na capital.
Biólogo
Com mestrado em Michigan e doutorado pela Universidade de São Paulo
(USP) em taxonomia de algas, o biólogo Carlos Eduardo de Mattos Bicudo
analisou as lâminas com restos de sedimentos do sapato e do tapete do
carro de Mizael. Para o especialista, trata-se de uma alga aquática e
subaquática que exige substrato (rochas, plantas) para se fixar.
Segundo ele, normalmente são plantas que ficam às margens da represa.
"Tudo indica a presença dele [Mizael, na represa]", afirmou.
Bicudo contou que ao analisar as lâminas sabia que se tratava do caso
da morte de Mércia Nakashima e posteriormente, soube que alga foi
encontrada na sola do sapato de Mizael. Quando questionado sobre a
possibilidade de Mizael ter pisado na beirada da represa, o biólogo
afirmou: “de outra forma não sei como essa alga ia parar na sola do
sapato dele.”u.
O especialista disse que alga pode aparecer em diferentes represas, mas
nunca em uma poça d´água tal como a defesa chegou a mencionar ao longo
dos anos. A alga, encontrada já morta mas com características
preservadas, estava fixada em uma planta. Na terra, essa alga não
poderia se fixar. Segundo ele, o elemento de reprodução precisa de algum
lugar que tenha solidez.
O promotor Rodrigo Merli Antunes aproveitou para fazer questões sobre o
relatório produzido por Osvaldo Negrini, que contestam os resultados da
perícia que incriminam os acusados. “Conteúdo científico- biológico não
tem”, declarou.
"Há quanto tempo aderida ao sapato?", questionou o advogado Samir
Haddad, que defende Mizael. “Deu [para analisar] tinha características
internas das células. Se tivesse mais de quatro semanas no sapato seria
impossível identificar. Podia estar até umas três semanas", respondeu o
biólogo.
Engenheiro
O terceiro a falar nesta segunda-feira foi o engenheiro Eduardo Amato
Tolezani apresentou, em projeção na parede do plenário do Fórum de
Guarulhos, a metodologia usada na análise das ligações feitas pelo
celular de Mizael e do posicionamento do carro do réu na noite do crime.
Durante a apresentação, advogados de defesa e promotor discutiram.
Para baixar o calor do momento, o juiz Leandro Bittencourt Cano pediu calma. "Vamos nos conter sobre as ofensas pessoais."
5 mulheres e 2 homens formam júri
O júri popular do advogado e policial reformado Mizael Bispo de Souza,
45 anos, começou por volta das 10h40. No início da sessão, o corpo de
jurados foi formado com cinco mulheres e dois homens. O julgamento será o
primeiro do país a ser transmitido ao vivo, segundo o Tribunal de
Justiça de São Paulo.
Mizael chegou ao fórum às 8h20 e, durante os trabalhos preparatórios
para o início de seu julgamento, já sem algemas e sentado junto a
advogados, chorou no plenário do Fórum de
Guarulhos.
Ele teve de deixar a sala por ordem do juiz Leandro Cano, a pedido do
Ministério Público, para que as testemunhas do caso começassem a serem
ouvidas. A mãe de Mércia, Janete Nakashima, também chorou neste momento.
O réu responde por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe,
meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa da vítima). De acordo
com a denúncia, Mizael matou a ex-namorada, então com 28 anos, porque
ela não queria reatar o relacionamento.
O policial reformado afirma que não estava na cena do crime e que
passou a noite em que Mércia Nakashima desapareceu com uma garota de
programa. A Promotoria, no entanto, diz ter provas que derrubam a versão
do acusado, como o laudo que mostra que o sapato dele tinha alga
compatível com as da represa de Nazaré.
O vigia Evandro Bezerra Silva, que também é réu do caso, só será levado
a julgamento no dia 29 de julho. Seu advogado, Aryldo de Paula, esteve
no Fórum de Guarulhos, mas teve seu pedido para participar da audiência
indeferido pelo juiz.
"Eu entendo que é perfeitamente cabível minha presença dentro do
plenário até para evitar o excesso de acusação. Podem surgir fatos neste
plenário que podem prejudicar meu cliente e estarei ali para
contradizer essas versões", justificou. O defensor disse que vai
apresentar um pedido de habeas corpus para a desembargadora Angélica de
Almeida, relatora do caso, para participar do plenário.
A expectativa é que o julgamento dure cinco dias. Com os jurados
definidos, começaram a ser colhidos os depoimentos das testemunhas. Em
seguida, o réu será interrogado. Depois, tem início a fase de debates.
O promotor Rodrigo Merli Antunes e o assistente da acusação Alexandre
de Sá Domingues, advogado contratado para defender os interesses da
família Nakashima, irão apresentar aos jurados o que consideram ser as
provas de que Mizael matou Mércia. Deverão ser exibidas fotos e vídeos
da vitima em vida e de quando foi encontrada morta. A gravação que
mostra o réu batendo na mesa durante um interrogatório também deverá ser
usada. A defesa também apresentará seus argumentos. No final, os
jurados se reúnem na sala secreta para decidir se absolvem ou condenam o
réu. A sentença caberá ao magistrado.
Conheça as principais provas reunidas pela acusação e o que alega a defesa de Mizael:
Laudo mostra que foram feitas pelo menos seis ligações para o celular
de Mizael. Exame identifica que, pelas Estações Rádios Bases (ERbs) é
possível indicar que o ex-namorado de Mércia estava perto saindo de
Nazaré Paulista e indo para Guarulhos perto do horário em que a vítima foi morta em 23 de maio de 2010.
O que diz a defesa -
alega que nesse dia as ERBs estavam congestionadas e deslocaram a
chamada para o telefone de Mizael para outras antenas mais distantes.
Laudo demonstra que Mizael circulou ao redor da casa de Mércia e que
veículo dele ficou parado das 18h37 às 22h12 no estacionamento de um
hospital em Guarulhos no horário do crime. Para a acusação, o ex havia
ido com Mércia no carro dela para Nazaré nesse horário. O que diz a defesa: alega que Mizael estava com uma garota de programa nesse horário e que o rastreador estava com problema.
ALGA NO SAPATO
Biológo detectou que alga achada no sapato de Mizael é compatível com a
encontrada no fundo da represa de Nazaré Paulista, onde Mércia foi
morta. O que diz a defesa: a alga existe em qualquer lugar úmido. Portanto não dá para concluir que seja exclusiva da represa.
Exame não é conclusivo para saber de quem é material genético, mas indica que a substância é humana. O que diz a defesa: resultado é inconclusivo.
Estilhaços de material que seria osso humano foram achados no calçado e
veículo de Mizael. Quando Mércia foi baleada, teve fratura nos ossos da
face e da mão. O que diz a defesa: resultado é inconclusivo.
Parte de material metálico, que seria de bala, foi encontrada no
calçado e veículo de Mizael. Acusação suspeita que seja parte das balas
que atingiram Mércia. O que diz a defesa: resultado é inconclusivo.
Os advogados Samir Haddad Júnior e Ivon Ribeiro, que defendem Mizael,
contestam as provas apresentadas pela acusação. “Não há nada no processo
que coloque Mizael na cena do crime”, disse Haddad Júnior. "E isso será
provado diante dos jurados".
http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/03/irmao-de-mercia-nakashima-biologo-e-engenheiro-falam-ao-juri-no-1-dia.html