sábado, 28 de março de 2020

Campanha do Planalto contra isolamento eleva tensão política no País


Jair Bolsonarogoverno federal divulgou uma campanha publicitária chamada “O Brasil não pode parar” para estimular que pessoas deixem as suas casas em meio à pandemia de coronavírus e voltem a trabalhar. A iniciativa faz parte da estratégia do Palácio do Planalto para reforçar a narrativa do presidente Jair Bolsonaro de que é preciso retomar as atividades para reduzir os impactos na economia.

A campanha também contraria restrições impostas – em maior ou menor escala – nos 27 Estados e ao menos 23 capitais do País, como fechamento de escolas, lojas e igrejas. Segundo reportagem da rede britânica BBC, cerca de 70 países no mundo decretaram algum tipo de medida de isolamento. De acordo com a agência France Presse, as restrições atingem pelo menos 2,8 bilhões de pessoas, o que representa mais de 1/3 da população mundial. A Organização Mundial da Saúde (OMS) não tem um levantamento oficial.
A senha para que apoiadores de Bolsonaro difundisse a campanha foi dada ainda na quarta-feira, quando o governo divulgou uma postagem no Instagram com a hashtag #OBrasilNãoPodeParar”. “A quase totalidade dos óbitos se deu com idosos. Portanto, é preciso proteger estas pessoas e todos os integrantes dos grupos de risco, com todo cuidado, carinho e respeito. Para estes, o isolamento. Para todos os demais, distanciamento, atenção redobrada e muita responsabilidade. Vamos, com cuidado e consciência, voltar à normalidade”, diz o texto.
Na noite de quinta, um vídeo com o mesmo mote e com a marca do governo federal foi divulgado pelo senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), filho do presidente, nas redes sociais. A campanha começou a circular em grupos bolsonaristas no WhatsApp com a seguinte mensagem: “Vou passar de primeira mão a propaganda que o governo federal vai veicular a partir de amanhã.” Integrantes do governo também enviaram o material para seus contatos. 
O vídeo de 1 minuto e 27 segundos mostra cenas de trabalhadores em atividades com um narrador ao fundo repetindo o tema da campanha. “Para ambulantes, engenheiros, feirantes, arquitetos, pedreiros, advogados, professores particulares e prestadores de serviço em geral, o Brasil não pode parar”, diz a narração. 
A propaganda do governo federal se assemelha a uma campanha feita em fevereiro pela prefeitura de Milão, na Itália. O prefeito da cidade, Giuseppe Sala, reconheceu que errou ao ter divulgado o slogan “Milão não para”. A cidade é uma das mais afetadas pela pandemia no país europeu, que ontem ultrapassou a marca dos 5 mil mortos pela doença.
Um grupo de parlamentares, que inclui o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e a deputada Tabata Amaral (PDT-SP), afirmou ontem que vai entrar com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a campanha. O argumento é que a peça contraria especialistas e é um crime por prejudicar a saúde dos brasileiros. Em ofício encaminhado ao presidente, a Frente Nacional de Prefeitos também cobrou explicações e ameaça ir à Justiça.
Secretaria de Comunicação da Presidência afirmou, em nota, que o vídeo tinha um “caráter experimental” e “que não houve qualquer gasto ou custo” na sua produção. A Secom informou ainda que o vídeo não tem relação com a contratação por R$ 4,9 milhões de uma agência de publicidade sem licitação.
Integrantes do Palácio do Planalto atribuíram a divulgação do vídeo a um vazamento na própria secretaria, comandada por Fabio Wajngarten – que está de quarentena após ser contaminado pela covid-19.

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