Ao
dispensar aos mensaleiros com mandato o mesmo tratamento dado ao
deputado-presidiário Natan Donadon, a Câmara se autocondenou a um
ridículo de dimensões planetárias. Nos próximos dias, dependendo da
decisão a ser tomada pelo STF, pode tornar-se o único Legislativo do
mundo a abrigar dois deputados que, após o expediente, serão algemados,
embarcados no camburão e conduzidos à cadeia, onde passarão suas noites.
O
STF inaugura na tarde desta quarta-feira a terceira fase do julgamento
do mensalão. Nesse estágio, os ministros do Suprema Corte vão julgar a
segunda rodada de embargos de declaração, como são chamados os recursos
que visam corrigir eventuais contradições, omissões ou obscuridades do
veredicto. Para 13 dos 25 réus, será o fim da linha. Sem a possibilidade
de manejar novos recursos, já poderão ser enviados ao xadrez.
Estão
nesse grupo os deputados federais Valdemar Costa Neto (PR-SP),
condenado a 7 anos e 10 meses de cana; e Pedro Henry (PP-MT),
sentenciado a 7 anos e 2 meses. Como pegaram menos de 8 anos, a lei lhes
assegura o regime semiaberto. Poderão requerer o usufruto do direito de
deixar o presídio durante o dia para “trabalhar''. Seus mandatos
expiram em fevereiro de 2015. Enquanto não forem cassados, continuarão
desfilando pelos corredores da Câmara.
A situação de Valdemar e
Henry é diferente da do outro colega-presidiário. Condenado a mais de 13
anos de prisão, Natan Donadon (ex-PMDB-RO) não pode deixar o cárcere.
Depois que a Câmara decidiu, em votação secreta, preserver-lhe o
mandato, Donadon ingressou no STF com um pedido de mudança de regime
prisional. Queria retomar suas atividades na Câmara. Mas o ministro Luís
Roberto Barroso, relator do caso no Supremo, indeferiu a liminar.
Preso,
Donadon perdeu o gabinete, os assessores, o salário e todos os
benefícios que o dinheiro público pode pagar. No caso de Valdemar e
Henry, a Câmara não terá como sonegar-lhes a estrutura. A dupla
preservará o direito à sala. Espanto! Manterá o séquito de auxiliares.
Assombro!! E continuará recebendo salário mensal de R$ 26 mil, noves
fora as verbas destinadas a custear o exercício do mandato.
Estupefação!!!
Deve-se o inacreditável ao entendimento segundo o
qual a Constituição assegura à Câmara a última palavra sobre os mandatos
dos deputados condenados em útima instância. Adotada no caso Donadon e
repisada em parecer da Secretaria-Geral da Casa, essa tese é endossada
pela maioria dos membros da Mesa diretora, incluindo o seu presidente,
Henrique Eduardo Alves.
Em privado, Henrique diz que a tese não é
da Câmara, mas do próprio STF. Ele recorda que a posição do Supremo,
antes majoritariamente favorável à cassação automática dos sentenciados,
mudou depois que chegaram ao tribunal dois novos ministros: Teori
Zavaschi e Luis Barroso. No julgamento de Donadon, realça o presidente
da Câmara, o tribunal deliberou, por 6 votos a 5, que a palavra final
sobre as cassações cabe mesmo à Câmara.
Assim, os deputados
Valdemar e Henry, na bica de serem condenados pela Corte máxima do país,
num julgamento técnico que consumiu sete anos de análise e reanálise de
provas, serão, por assim dizer, rejulgados por seus pares, em processos
conduzidos sobre a perna e submetidos a toda sorte de vícios próprios
da corporação.
O brasileiro está sendo submetido a esse
antiespetáculo porque a Câmara mantém na gaveta há dois meses a PEC dos
Mensaleiros, proposta de emenda à Constituição que torna automática a
cassação de parlamentares condenados em último grau por improbidade
administrativa ou crimes contra a administração pública. A coisa não
anda porque o PT, legenda-mãe do mensalão, se recusa a indicar seus três representantes na comissão especial que deveria analisar a PEC.
O
que já é ruim pode se tornar pior se o Senado, em votação marcada para
esta quarta, se negar a aprovar a proposta que acaba com o voto secreto
nas votações do Congresso. Já aprovada na Câmara, essa emenda
constitucional abre o voto em todas as situações, inclusive na análise
de vetos presidenciais e de nomeações de ministros do STF, de
embaixadores e de diretores de agências reguladoras. Parte dos senadores
gostaria de restringir o voto aberto aos pedidos de cassação de
mandato. O diabo é que, se modificarem o projeto, ele retorna à Câmara. E
dificilmente será votado em 2013.
http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/2013/11/13/mensaleiros-podem-dormir-na-cadeia-e-dar-expediente-na-camara-durante-o-dia/
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