SÃO
PAULO, SP E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Com um terço do litoral
brasileiro - 2.500 km - atingido por manchas de óleo, o governo federal
ainda não sabe dizer se o problema está perto de ter um fim.
Nesta
terça (29), o ministro da Defesa, Fernando Azevedo, disse em
apresentação do balanço das ações tomadas até então que não há como
mensurar a quantidade de petróleo ou antever que rumo as manchas tomarão
no futuro. "Estamos aperfeiçoando os processos.", disse.
As
primeiras manchas de óleo a surgirem no litoral do Nordeste foram
vistas na Paraíba em 30 de agosto. Ao todo, 268 locais foram afetados em
94 cidades dos nove estados do Nordeste. A Bahia, até o momento, é o
estado o mais afetado, com 68 locais oleados.
Testes
feitos pela Petrobras e pela Marinha mostraram que o material não era
brasileiro. As análises indicavam assinatura venezuelana, uma mistura de
três campos de exploração no país. Em resposta, o governo de Nicolás
Maduro negou que seja responsável pelo desastre ambiental.
No
último dia 23, em pronunciamento oficial em rádios e televisão, Salles
afirmou que o governo brasileiro acionou a OEA (Organização dos Estados
Americanos) para que o país vizinho forneça informações sobre o
material.
Em
outras oportunidades, Salles e o presidente Jair Bolsonaro (PSL)
sugeriram, além da Venezuela, outros possíveis outros culpados, sem
apresentar provas.
Em
postagem numa rede social, Salles publicou foto antiga de uma
embarcação do Greenpeace, dizendo que ela estava próxima do litoral
brasileiro à época do vazamento, sugerindo ligação com o desastre. A ONG
disse que acionará a Justiça contra o ministro.
Bolsonaro,
por sua vez, sem mostrar evidências, questionou se o desastre ambiental
não teria sido premeditado para prejudicar a realização do megaleilão
de petróleo da cessão onerosa que será realizado em novembro. O
presidente não respondeu ao pedido de esclarecimento feito pela
reportagem.
Entre
as possíveis explicações para o vazamento estão uma falha na
transferência de óleo entre navios (ship-to-ship) ou mesmo vazamento de
óleo transportado em barris reaproveitados da Shell --algumas unidades
foram encontradas em praias brasileiras.
Autoridades
de 11 países foram notificadas para informar sobre eventual acidente
com cerca de 30 cargueiros. Mas não se sabe exatamente quantas
embarcações clandestinas, os chamados dark ships, passaram pelo local.
A
limpeza das praias tem sido feita por funcionários dos governos
estaduais e municipais dos locais afetados, além de militares das Força
Armadas, voluntários civis e presos.
Em
comunicado, a Marinha diz que já recolheu mais de mil toneladas de óleo
e que parte do material está sendo armazenado pela Petrobras.
A
estatal afirmou à reportagem que, a pedido do Ibama, está armazenando
provisóriamente cerca de 1.100 toneladas no Polo de Gerenciamento de
Resíduos do Alto de Jericó, em Carmópolis (SE). Já o Ibama, por meio do
site "Mancha no Litoral", diz que 1.027 toneladas foram retiradas de
praias do Nordeste.
A
reportagem questionou os órgãos que integram o grupo de ação do plano
de contenção de vazamentos --Ministério do Meio Ambiente, Ibama,
Ministério de Minas e Energia, Ministério da Defesa, Marinha e Agência
Nacional do Petróleo-- sobre o real volume de material recolhido e
destino, mas não obteve resposta.
A
Marinha, que coordena as operações do PNC (Plano Nacional de
Contingência de Incidentes com Óleo), disse que o material é armazenado
em recipientes apropriados e enviado à Petrobras e à empresas de
tratamento de resíduos.
"No
momento, está sendo feito um trabalho de interlocução direta com os
estados [...] para [...], realizar a destinação final ambientalmente
adequada", diz nota.
Em
abril, o governo Bolsonaro extinguiu dezenas de conselhos da
administração federal. Entre eles, estavam dois comitês que integravam o
plano de contenção. Segundo a reportagem apurou junto a servidores no
Ministério do Meio Ambiente, no Ibama e em ONGs, essa medida pode ser
parte da explicação para a demora do governo na contenção das manchas.
A
primeira vez que um órgão federal emitiu nota sobre as manchas foi em
27 de setembro, quando 114 locais já haviam sido afetados. Por meio de
ofício interno, a Marinha foi designada como coordenadora operacional
das ações e o PNC foi ativado.
O
governo só cumpriu a diretriz do manual que indica que deve haver um
centro que facilite o acesso às informações no 50º dia, quando um site
oficial foi lançado (gov.br/manchanolitoral).
Por
causa da demora a agir, a União foi alvo de uma ação do MPF (Ministério
Público Federal) por omissão. O órgão solicitou que o PNC fosse ativado
em no máximo 24 horas. A Justiça de Sergipe decidiu que o governo já
havia ativado o plano após receber a resposta da União.
Na
última sexta (25),o Ministério Público junto com o TCU (Tribunal de
Contas da União) pediu abertura de uma fiscalização para apurar a
conduta do governo federal na resposta ao vazamento de óleo no litoral
do Nordeste. A ação questiona a resposta dos órgãos federais para
minimizar danos ambientais.
Hoje
na corte há duas representações que questionam as ações do governo no
combate às manchas de óleo no NE. Uma é de autoria do senador Renan
Calheiros (MDB-AL) e a outra do deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP).
O
óleo já atingiu o ecossistema de 14 unidades de conservação, incluindo
parques nacionais, áreas de proteção ambiental, reservas extrativistas,
reservas biológicas e áreas de interesse ecológico.
Sensíveis
devido a ampla diversidade biológica, essas áreas são protegidas por
regras que limitam sua ocupação e uso dos recursos naturais. Uma das
regiões mais atingidas foi a Costa dos Corais, segunda maior área
marinha protegida do Brasil.
De
acordo com a Marinha, o ponto mais ao norte atingido foi a ilha
Caçacueira, no Maranhão. Já o local mais ao sul foi Ilhéus, na Bahia.
Há
a preocupação de que as manchas cheguem ao arquipélago de Abrolhos e
sigam para o Sudeste, especialmente o litoral do Espírito Santo. O
almirante de esquadra Leonardo Puntel, comandante de Operações Navais da
Marinha, afirmou que o óleo se desloca de forma submersa, com dinâmica
imprevisível. Prova disso, segundo ele, é que a poluição foi detectada
na Bahia, apareceu depois ao norte, em estados como Pernambuco, e em
seguida voltou a ser notada na Bahia.
"Isso
significa e mostra a dificuldade de prever para onde essas manchas
vão", declarou. "Esse movimento não tem uma lógica matemática."
Foram
empenhados nesta terça três (29) navios perto de Abrolhos, na tentativa
de monitorar o comportamento das manchas. A previsão é que mais dois
sejam empregados mais dois nesta quarta (30).
Segundo
Guilherme Lessa, da UFBA, a partir de setembro, tende a existir um
deslocamento de massas de água costeiras para o sul, o que pode levar o
óleo para regiões mais distantes. Contudo, não é possível prever se e
quando o Sudeste e o Sul serão afetados, dado que não se sabe exatamente
a origem nem a quantidade de óleo vazada.
À
reportagem a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente e da Defesa
Civil de São Paulo disse acompanhar o caso e as ações de combate ao óleo
no Nordeste. "As equipes de emergência química da Cetesb, da Polícia
Ambiental, os especialistas das universidades e do IPT [Instituto de
Pesquisas Tecnológicas] estão alertas e prontos para atuar de acordo com
as diretrizes da União e em parceria com os municípios".
Já
a Seas (Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade do Rio de
Janeiro) disse ter criou na última quinta (24) um grupo de trabalho para
acompanhar as manchas. O grupo inclui representantes da secretaria e do
Inea (Instituto Estadual do Ambiente). "O órgão ambiental estadual
possui um Plano de Contingência institucional, [...] e encontra-se no
estágio de vigilância", diz nota da Seas.
Os órgãos ambientais do Espírito Santo também foram procurados, mas não se manifestaram.
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