O chamado dinheiro de plástico é o maior vilão das famílias. Taxa de juros chegou a 290,43% ao ano
Um
limite que estoura aqui, uma fatura que não é paga em dia ali, e assim,
as dívidas com cartão de crédito aumentam mês após mês no Distrito
Federal. Segundo a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do
DF (Fecomércio-DF), 90,7% dos brasilienses declaram estar comprometidos
nessa modalidade.
E não é para menos. O maior problema é que no mês passado a taxa de
juros do cartão chegou aos astronômicos 290,43% ao ano. Por esse motivo,
ao invés de aliado, ele pode se tornar inimigo das finanças familiares
se não for utilizado adequadamente.
De acordo com a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do
Consumidor (Peic) de março, divulgada pela Fecomércio-DF, o cartão de
crédito permanece em primeiro lugar no ranking do endividamento no
Distrito Federal. Na sequência, vêm as despesas com financiamento de
carro (33,3%), carnês (22,5%) e cheque especial (21,7%).
No geral, o número de famílias endividadas no DF passou de 602.980 em
fevereiro para 608.700 em março, um aumento de 5,7 mil. Isso representa
um percentual de 82,2% de famílias com algum tipo de dívida na capital
do País, contra os 81,4% de fevereiro.
A Peic identificou ainda que houve leve crescimento no número de
famílias com alguma dívida em atraso. O percentual passou de 7,6% em
fevereiro para 7,8% em março.
Se serve de alento, entre as famílias com contas em atraso, 61,5%
disseram ter condições de quitar suas dívidas totalmente e 38,5%
afirmaram poder pagar o montante parcialmente.
Rotativo
De acordo com a Associação Brasileira de Educadores Financeiros
(Abefin), no ano passado o endividamento no rotativo do cartão - quando o
consumidor decide pagar a quantia mínima estipulada na fatura do cartão
de crédito - cresceu 17% no Brasil, com um valor acumulado de R$ 29,8
bilhões. A inadimplência relacionada a essa modalidade também aumentou,
atingindo 40% em dezembro.
O garçom Gerson Silva Araújo, de 45 anos, não conseguiu pagar as
faturas dos três cartões de crédito que possuía desde 1997. Por conta
disso, acabou sujando o nome, há três anos. Até o cheque especial Gerson
perdeu.
“Cortaram todas as linhas de crédito que estavam disponíveis para
mim. O banco já me ligou várias vezes tentando renegociar, mas agora não
tenho condições. Quero terminar de pagar o financiamento do meu carro
para depois mexer com isso. Preciso resolver uma coisa de cada vez”,
alega.
Saiba mais
Apesar do aumento no número de devedores, o Centro-Oeste ainda não
figura entre as regiões mais tomadoras de crédito do País. Segundo
levantamento do BC, em janeiro a região ocupava a penúltima posição
quanto à distribuição de crédito, com uma carteira de R$ 308 bilhões.
Estava acima apenas do Norte, a menos tomadora, com R$ 113 bilhões.
Inflação, queda da renda e do desemprego
Para o diretor executivo de Estudos e Pesquisas Econômicas da
Associação Nacional dos Executivos de Fianças e Contabilidade (Anefac),
Miguel José de Oliveira, o aumento no uso do cartão de crédito está
intimamente ligado à situação econômica atual.
“O aumento da inflação, dos impostos, nos índices de desemprego e,
consequentemente, a queda na renda familiar, têm levado as pessoas a
usarem mais o cartão de crédito. O produto, por sinal, tem a maior taxa
desde 1999: 290% ao ano, em média”, explica.
Segundo ele, desde 2003 o Banco Central do Brasil (BC) vem subindo a
taxa básica de juros da Selic e a tendência é que continue assim.
Consignado
Questionado sobre a melhor opção de crédito para quem está
endividado, o educador financeiro Sílvio Bianchi responde que “não há um
produto certo”. “De maneira geral, o consignado é uma boa escolha. Como
o pagamento das parcelas é atrelado a garantia do recebimento do
salário, as taxas são mais baixas, em média 2,5%”, afirma.
Ainda de acordo com o educador, antes de escolher a modalidade de
crédito, no entanto, é preciso responder a duas perguntas básicas:
quanto ganho e para onde está indo o dinheiro.
Finanças mantidas sob controle
A comerciante Leila Barbosa, de 30 anos, foi mais radical para
não se endividar com o dinheiro de plástico. Ela resolveu parar de usar
os dois cartões de crédito que possuía. “O cartão é uma ilusão. Você
acaba contando com um dinheiro que não tem. Me enrolei tanto, que
precisei vender um carro popular de aproximadamente R$ 15 mil em 2014
para conseguir pagar minhas dívidas. Desde então, para ter maior
controle das finanças, joguei todos os cartões no lixo”, afirma ela.
Em relação às transações de valores mais altos, como uma passagem
de avião, por exemplo, ela diz que se não tiver dinheiro para pagar à
vista, simplesmente não compra. “Abri mão desse conforto para evitar dor
de cabeça”.
Organização
Já o engenheiro Salomão Neto, de 42 anos, aprendeu desde cedo a
manter as finanças sob controle. “Nunca ganhei muito e moro sozinho
desde os 18 anos. Então, para pagar minhas contas em dia e ainda ter
algum dinheiro para o lazer, precisei aprender a me organizar. Se não
for bem utilizado, o cartão de crédito se torna vilão”, alerta.
O engenheiro diz que evita ter muitos cartões. “Dois são mais do
que suficientes. Além disso, o limite não precisa ser muito alto. Mesmo
que a operadora do cartão conceda, o que não é raro, em um momento de
desespero o limite elevado pode ser tentador”, acredita.
Dessa forma, Salomão tem conseguido se bancar, sem a a ajuda dos
pais, desde que saiu de casa para estudar. “Passei aperto até aprender o
que é realmente essencial em termos de despesas. Mas depois que
entendi, comecei até a poupar. Hoje meu dinheiro trabalha mais para mim
do que eu para ele”, brinca.
Cuidado
Assim como a bancária Erika Bastos, de 33 anos. Por ser bancária,
ela não pode ter restrições no nome e toma cuidado ao utilizar linhas de
crédito, especialmente cartão.
“Uso o cartão muito pouco, apenas para parcelar compras de valor
alto, e pago sempre o total da fatura. Sei que perco alguns benefícios
como pontos e milhas por não comprar tanto no crédito, mas prefiro
manter as contas em dia”.
O peso das despesas extras
Na avaliação do presidente da Fecomércio-DF, Adelmir Santana, a
situação atual da economia brasileira, aliada às despesas extras do
primeiro trimestre do ano contribuíram para o aumento do endividamento e
da inadimplência.
“Os aumentos nas taxas de serviços públicos, como água e luz, a
alta de alguns produtos e serviços e a menor concessão de crédito nos
bancos públicos motivaram esse quadro de endividamento elevado”, explica
Adelmir Santana.
Educação financeira é fundamental
De acordo com o educador financeiro Sílvio Bianchi, 70% dos
brasileiros não controlam o orçamento. “As pessoas não são educadas
financeiramente. Todo mundo conhece os produtos de crédito, mas não sabe
como usá-los. Porém, diante do momento econômico delicado que o País
atravessa, acabam recorrendo a essas modalidades.”
Segundo ele, a primeira coisa que deve ser feita para evitar o
endividamento com cartão é não possuir limite de crédito que ultrapasse
50% dos rendimentos líquidos.
Para quem já está devendo, porém, o produto está longe de ser a
melhor opção. “É muito caro. Os juros mensais giram em torno de 11%.
Enquanto isso, a taxa do cheque especial - que também não é nada barata
-, não passa de 9%. Por incrível que pareça, é melhor entrar no cheque
do que usar o cartão”.
O especialista desaconselha o pagamento parcial da fatura do cartão
de crédito. “A taxa de juros é absurdamente alta, entre 13% e 15%”,
alerta. Também não é recomendável ter mais de dois cartões de crédito
com datas de vencimento diferentes. “Se já é difícil para muitas pessoas
controlar um, imagine vários”, completa.
Sobre o uso das opções débito ou crédito, não há regra. “Depende do
nível de controle da pessoa. Aproveitar os benefícios do crédito é
interessante na medida em que a pessoa consegue pagar, a longo prazo, o
que está comprando. Se a pessoa acha que digitando a senha mágica não
precisará mais pagar por aquilo, então é melhor usar o cartão só no
débito mesmo”, conclui Bianchi.
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