domingo, 20 de julho de 2014

Casos de pais que abusam dos filhos são mais comuns fora dos centros urbanos

Especialistas dizem que isolamento e conivência dos vizinhos protegem pedófilos

O caso de incesto descoberto pela Polícia Civil de Santa Catarina — duas irmãs foram estupradas durante anos pelo pai e tiveram seis filhos com ele — pode não ser um fato isolado no País. Especialistas ouvidos pelo R7 dizem que casos como esse são mais comuns do que se pode imaginar e surgem com mais frequência fora dos centros urbanos.

Apesar de o pai estar preso, as jovens de Rio Negrinho, que agora aumentam as estatísticas de violência sexual, decidiram deixar a cidade com medo de novas ameaças de morte por parte do agricultor de 45 anos. A família vivia em uma casa simples na zona rural da cidade, no interior de Santa Catarina. No imóvel, moravam o suspeito, a mulher, nove filhos — incluindo as duas vítimas — e os três filhos de cada uma delas. Além disso, a filha mais nova está grávida do quarto filho do pai. A jovem está no terceiro mês de gestação.

Christian Ingo Lenz Dunker, psicanalista e professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, avalia que, tal como o verificado em Rio Negrinho, o isolamento das famílias favorece a prática de abusos sexuais semelhantes.

— O incesto é relativamente comum em lugares mais afastados, as circunstâncias favorecem. Em geral, é uma pessoa que já tem uma disposição de evitar os outros, em relação a limites e, por outro lado, existe uma tolerância social, os vizinhos não delatam, tem uma certa conivência.

A ausência do Estado, do que representa simbolicamente a lei, proporciona um ambiente sem regras onde o incesto pode surgir. Já as mães acabam sendo coniventes com os abusos porque temem perder a ligação com os maridos. O psicanalista diz que, provavelmente, quando o pai sai para trabalhar, em tese, a mãe se torna uma substituta da regra do pai.

Outro caso que guarda características semelhantes ao de Santa Catarina aconteceu no Maranhão e chocou o Brasil em 2010. O lavrador José Bispo Agostinho estuprou e manteve as próprias filhas em cárcere privado por 17 anos. Ele começou estuprar e prender sua filha mais velha quando ela ainda tinha 15 anos. A mulher, hoje com 35 anos, teve um bebê com o próprio pai. Além dela, a irmã mais nova sofreu abusos por 17 anos e tem sete filhos.

Segundo a delegada que investigou o caso, na época, o lavrador assumiu em depoimento que seis das oito crianças são filhas-netas dele. Condenado a 17 anos de prisão, o trabalhador rural foi morto decapitado durante uma rebelião em 2011, na delegacia da cidade de Pinheiro, enquanto aguardava transferência para o presídio de Pedrinhas.

Segundo Christian Dunker, em muitos casos, os crimes são motivados pelo sentimento de posse e poder dos pais sobre as filhas.

— É mais uma questão de poder do que sexo. É a possibilidade de você se aproveitar de uma pessoa que não tem condições para se defender. É um pai que não quer dividir as filhas com o mundo, com os outros.

Machismo x denúncia
Para a coordenadora nacional de Enfrentamento a Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), Silvia Giugliani, o País precisa assumir suas características e unir toda a sociedade para proteger indefesos de crimes cometidos pelos próprios familiares.

— Vivemos em um País machista que trabalha na lógica da submissão. Isso faz com que as vítimas de violência sexual e as pessoas ao seu redor hesitem em denunciar os responsáveis pelos abusos.

 http://noticias.r7.com/cidades/casos-de-pais-que-abusam-dos-filhos-sao-mais-comuns-fora-dos-centros-urbanos-20072014

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