domingo, 5 de maio de 2013

Sem filhos, doméstica cria sobrinha com Down rejeitada pelos pais no DF


Marcileia Pollyanna e a tia Marlene, que a criou (Foto: Raquel Morais/G1) 

'Minha irmã batia nela porque ela me chamava de mãe', lembra Marlene.
Hoje, a sobrinha dela tem 30 anos, é casada e tem três filhas.


Apesar de nunca ter engravidado, Marlene Pereira dos Santos, de 50 anos, sempre tem a casa cheia no dia das mães. A visita e o carinho preferidos cabem à sobrinha Marcileia Pollyanna, que foi rejeitada pelos pais por ter deficiência mental e traços de Síndrome de Down. A moradora de Ceilândia, no Distrito Federal, assumiu a criação da menina mesmo ganhando apenas um salário mínimo a vida inteira como empregada doméstica.

O diagnóstico veio quando a criança tinha quatro meses. "Ela vivia doentinha e precisou ser internada. Ficou mais de mês no hospital. Aí um dia o médico disse para a minha irmã que ela teria que ser forte e contou o motivo. E ela gritava: 'Eu tive filho normal, não tive filho Down nenhum, não. Eu não quero essa menina'. Aquilo cortou meu coração", lembra Marlene.
Laudos apontam deficiência mental e traços de síndrome de Down em Marcileia Pollyana (Foto: Raquel Morais/G1)Laudos apontam deficiência mental e traços de síndrome de Down em Marcileia Pollyana (Foto: Raquel Morais/G1)
 
A tia decidiu garantir que, além de muito amor, a garota teria uma vida como a de qualquer outra criança, respeitando as limitações dela. Primeiro, procurou ajuda especializada: durante toda a infância, Pollyanna foi acompanhada por psicólogos e neurologistas e tomou medicamentos para combater crises convulsivas. Além disso, sempre estudou em escolas de ensino especial e participou das atividades oferecidas pelo colégio.

"A deficiência existe, claro, mas ela é só um detalhe quando se tem amor. E sem amor não tem nada que dê certo, mesmo se a pessoa não tiver deficiência", afirma. "Ela é meu maior orgulho. Já ajudei outras sobrinhas, minha casa fica aberta para quem precisar de abrigo, mas ela é diferente. Tenho certeza de que Deus a fez para mim. Eu a amo mais do que tudo."

A deficiência existe, claro, mas ela é só um detalhe quando se tem amor. E sem amor não tem nada que dê certo, mesmo se a pessoa não tiver deficiência. Ela é meu maior orgulho. Já ajudei outras sobrinhas, minha casa fica aberta para quem precisar de abrigo, mas ela é diferente. Tenho certeza de que Deus a fez para mim. Eu a amo mais do que tudo."
 
Marlene Pereira dos Santos, que criou a sobrinha rejeitada pelos pais por ter deficiência mental e traços de síndrome de Down
 
Foi graças ao esforço da tia que Pollyanna pôde, aos 17 anos, passar 21 dias participando de um campeonato de handebol nos Estados Unidos. A jovem ganhou a vaga de goleira em um sorteio da escola, mas dependia de conseguir a documentação a tempo e da assinatura da mãe biológica para viajar. Coube a Marlene convencer a irmã.

"Pedi R$ 600 adiantado para a minha patroa, para poder tirar passaporte, fazer as fotos e dar algum dinheirinho para ela, né. E discuti com a minha irmã. Falei que ela não precisava se meter, que já que nunca quis me dar a guarda, ao menos deixasse a menina viver. Ela dizia que a filha não merecia. Insisti. Falei que eu cuidava de tudo. Com muito custo ela assinou. Aí o juiz assinou também, representando o pai", conta.

Por causa da proximidade entre tia e sobrinha, Marlene afirma que a irmã começou a sentir ciúme e já quis pegar a filha de volta. A ex-doméstica lembra que precisou ensinar Pollyanna a gostar da mãe, além de sempre estar reforçando o carinho entre elas. "Minha irmã batia nela porque ela me chamava de mãe."

Reconhecimento
Hoje, aos 30 anos, casada e com três filhas, Pollyanna ajuda a sustentar a tia, que está desempregada desde o ano passado. Trabalhando como faxineira de uma faculdade de Taguatinga, ela afirma que Marlene é o "alicerce" da vida dela.

Marcileia Pollyanna e a tia Marlene, que a criou (Foto: Raquel Morais/G1)
"Ela é meu tudo, sempre foi. Gostaria de poder fazer mais por ela. Meu grande sonho, se Deus quiser a gente dá um jeito até o fim do ano, é tirá-la desse aluguel. Ela deixou a casa enorme que ela tinha para vir morar perto de mim. Hoje, ainda cuida da minha menina mais velha durante a semana. Ela é tudo", afirma.

Pollyanna diz não sentir raiva da mãe. Ela afirma que a visita com frequência para conversar e que sempre oferece ajuda. Mas, segundo ela, o sentimento de amor e gratidão são e sempre serão mesmo por Marlene.

"Não é e nunca vai ser igual. Quando eu era criança, minha tia conseguiu uma cirurgia para corrigir minha miopia – enxergo menos de 10%, mas teve que viajar e deixou para a minha mãe me levar. Ela nem se importou", diz. "Se minha tia estivesse aqui, não importaria a situação, seria prioridade. Eu sempre fui a dela. Ela sempre me amou. E é por isso que me orgulho muito de ser o maior orgulho dela."

 http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2013/05/sem-filhos-domestica-cria-sobrinha-com-down-rejeitada-pelos-pais-no-df.html

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