Presidente é mais impopular que Dilma na véspera da votação do impeachment, mas mantém apoios importantes no Congresso e na elite econômica; Câmara dos Deputados vota andamento de denúncia contra Temer por corrupção passiva nesta quarta.
Assim como a ex-presidente Dilma Rousseff em abril de 2016, o presidente Michel Temer amarga índices baixíssimos de popularidade no momento em que enfrenta uma votação crucial na Câmara dos Deputados.
Aliás, sua taxa de aprovação hoje (apenas 5%, segundo o Ibope) é até
mesmo pior que a da petista em março do ano passado (10%), pouco antes
da Casa aprovar a continuidade do processo contra ela.
Apesar disso, a expectativa é de que Temer consiga barrar nesta
quarta-feira o andamento da denúncia da Procuradoria-Geral da República
que o acusa de corrupção passiva, impedindo que o Supremo Tribunal
Federal possa avaliar a abertura de uma ação penal que afastaria o
presidente por até seis meses.
Mas se não é popularidade, o que Temer tem que Dilma não tinha e lhe garante força para resistir no cargo?
Segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil, o presidente sobrevive de
uma mistura de forte articulação política no Congresso, ausência de
protestos de massa nas ruas e apoio da elite econômica satisfeita com o
andamento de reformas impopulares.
"A principal diferença é que o Temer tem apoio de quem importa", resume
o professor de gestão de políticas públicas da USP Pablo Ortellado.
"Ele não tem apoio popular, mas ainda tem um bom apoio no Congresso, do
empresariado, e a oposição não está fazendo esforço nenhum de
derrubá-lo", ressalta.
Ortellado tenta explicar a falta de grandes protestos nas ruas. De um
lado, observa, os movimentos sociais de esquerda que têm ligação com o
PT aderiram à estratégia do partido de deixar o atual governo sangrar
até 2018, já que a baixíssima popularidade de Temer deve garantir um
espaço privilegiado de campanha para a oposição na próxima eleição.
De outro lado, afirma Ortellado, os movimentos anticorrupção que
derrubaram Dilma tampouco estão mobilizados em grandes manifestações
para afastar Temer. Esses grupos em geral têm viés econômico liberal que
se alinha com a agenda de reformas do governo.
Além disso, nota ele, a excessiva polarização da sociedade entre
"petralhas" e "coxinhas" dificulta que esquerda e direita se unam no
movimento "Fora, Temer", embora as pesquisas de opinião indiquem que
essa seja uma pauta comum à grande maioria da sociedade.
"Temer não tem apoio popular. Um movimento de rua de consistência o
derrubaria com certeza, mas quem convoca o movimento de rua não quer
derrubá-lo", diz o professor da USP.
Por parte dos empresários, Ortellado acredita que prevalece uma
satisfação com as reformas que Temer tem implementado, como a criação de
um teto para o aumento dos gastos públicos e as mudanças nas regras
trabalhistas - e com as que ainda pretende aprovar, como a da
Previdência.
"Realmente, o presidente Temer tem proporcionado medidas para o futuro
do país fantásticas. Está mexendo em muita coisa que tem que ser feita.
Quem sabe o que permite isso é sua baixa popularidade, porque é alguém
que não está buscando resultados imediatos", afirma o presidente da
Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos
Martins, ao defender a continuidade do governo.
Para Martins, a troca de presidente traria mais instabilidade para o
país. Além disso, o líder empresarial sustenta que a denúncia contra
Temer "é muito fraca".
O presidente é acusado de ser destinatário de propina negociada entre o
dono da JBS Joesley Batista e o ex-assessor de Temer Rodrigo Rocha
Loures, indicado pelo presidente como seu interlocutor para resolver
questões da empresa junto a órgãos públicos, em conversa gravada pelo
empresário.
Loures, por sua vez, foi gravado depois recebendo uma mala de R$ 500
mil, mas a defesa de Temer nega que o presidente tenha dado aval a esse
pagamento ou fosse se beneficiar dele. Aliados do presidente têm
ressaltado também que a PGR não realizou o monitoramento do destino da
mala de R$ 500 mil de modo a provar que ele iria para Temer.
"Quem lê as 64 páginas da denúncia não consegue ser convencido do preço
a ser pago (pela troca de presidente). É uma denúncia muito fraca para o
trauma que nós estamos vivendo, para ter mais seis meses do Brasil
parado", afirma Martins.
Congresso, o apoio mais importante
Se o silêncio das ruas e o apoio dos empresários ajuda Temer a
sobreviver, seu maior trunfo está na sua capacidade de articulação no
Congresso, observa a professora de Ciências Políticas da USP Maria
Hermínia Tavares. Ela ressalta que Temer foi três vezes presidente da
Câmara dos Deputados.
"Ele conhece profundamente o Congresso e tem uma atenção especial com
as parlamentares, que não consiste só em liberar emenda (recursos para
as bases eleitorais dos congressistas), distribuir cargos. Ele também
trata bem, coisa que Dilma e (o ex-presidente Fernando) Collor
(derrubado em 1992 por impeachment) nunca fizeram. Temer passa boa parte
do tempo conversando com os parlamentares", reforça Tavares.
Para que o STF fique autorizado a analisar a abertura de um processo
penal contra Temer, são necessários 342 votos do total de 513 deputados.
Segundo levantamento do jornal
Folha de S.Paulo
, por enquanto apenas 194 dizem que votarão a favor do andamento da denúncia.
A votação, entretanto, só poderá ser realizada se houver um quórum
mínimo de dois terços da Casa, ou seja, se 342 deputados tiveram
registrado presença. Deputados da oposição chegaram a considerar a
possibilidade de tentar esvaziar a sessão para que não haja quórum - e,
assim, adiar a votação. Mas o presidente da Câmara, Rodrigo Maia
(DEM-RJ), disse recentemente estar confiante de que pelo menos 480
deputados estarão presentes.
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